O gastrinoma também é conhecido como Síndrome de Zollinger Ellison. Caracteriza-se pela presença de ulceração no jejuno proximal, hipersecreção ácida no estômago e tumor pancreático de células não beta (células produtoras de insulina).
Não existem fatores de riscos conhecidos para vir a ter o gastrinoma.
A incidência de gastrinoma é de aproximadamente 0,1 a 1% das pessoas que apresentam úlcera péptica. A maioria dos pacientes possui entre 20 e 50 anos (média de 40 anos). A incidência é maior em homens (1,5:1 a 2:1) do que em mulheres. Podem ser tumores isolados (80%) ou associados a uma síndrome chamada de MEN 1 (Neoplasia Endócrina Múltipla tipo 1).
São originados principalmente no duodeno em 70%, (parte do intestino delgado), no pâncreas (10%), mas também são encontrados em linfonodos peripancreáticos. Os gastrinomas de duodeno geralmente são de pequeno tamanho e múltiplos. Tem menor potencial maligno do que gastrinomas solitários de pâncreas.
Podem ser classificados em bem diferenciados e em mau diferenciados, de acordo com a patologia (exame do tumor). Os mau diferenciados tem maior agressividade.
Os sintomas são relacionados à alta secreção de gastrina. Aproximadamente 90% dos pacientes apresentam úlceras pépticas (no estômago ou douodeno). Podem apresentar pirose (queimação por refluxo) em 50%, diarreia em 70%, dor abdominal em 75%, perda de peso (15%), hemorragia digestiva em 25%.
O tempo médio entre os sintomas e o diagnóstico é de aproximadamente 5 anos. Pacientes que apresentam múltiplas ou recorrentes úlceras, ou em locais atípicos (duodeno distal e jejuno) aumentam a suspeita para gastrinoma. Metástases hepáticas estão presentes em um terço dos pacientes no momento do diagnóstico.
Exames de Sangue: Aumento do nível de gastrina (normal até 110pg/ml), realizado em jejum. Se o nível é acima de 1000, o diagnóstico é praticamente confirmado. Pacientes com acloridria (anemia perniciosa e gastrite atrófica) podem facilmente apresentar níveis de gastrina acima de 1000. Nestes pacientes é necessário aferir o pH da secreção gástrica. Niveis mais elevados de gastrina são sugestivos de gastrinoma pancreático, tumores maiores, ou com metástases. Dois terços dos pacientes possuem níveis entre 150 e 1000 pg/ml. O nível de gastrina pode estar aumentado nestes níveis em outras situações, como insuficiência renal, cirurgia gástrica ou extensa ressecção de intestino delgado prévia, uso anti-ácidos (inibidores de bomba de prótons – omeprazol…). A maioria dos kits que fazem a medida do nível de gastrina reconhecem apenas um sub-tipo de gastrina, o G-17, e podem dar um resultado normal, mesmo com uma secreção elevada da gastrina.
Nível de Cromogranina A: É um marcador de tumores neuroendócrinos mas não diferencia os subtipos. É elevado na maioria dos pacientes com gastrinoma e o nível correlaciona com o tamanho do tumor. Pode estar elevado mesmo sem a presença de metástases hepáticas. Em outros tumores neuroendócrinos, a Cromogranina geralmente é aumentada na presença de metástases hepáticas. Pode estar elevado em pacientes que fazem uso de inibidores de bomba de prótons (ex. omeprazol).
Teste de Estimulação com Secretina: Indicado quando há suspeita de gastrinoma com níveis de gastrina normais. Consiste na administração endovenosa de 0,4ug/kg de secretina, com aferição do nível de gastrina antes, 2, 5, 10 , 15 e 20 minutos depois. O diagnóstico é feito se há um aumento > 200 pg/ml em relação ao basal, o que acontece geralmente 10 minutos após a administração da secretina. Necessidade de parar com anti-acidos antes do teste é controversa na literatura.
Avaliação da secreção acida gástrica: Pouco utilizado atualmente.
Teste de Infusão de Cálcio: Consiste na administração endovenosa de gluconato de cálcio (5 mg/kg), com aferição do nível de gastrina e cálcio antes e a cada 30 minutos depois. O diagnóstico é feito se há um aumento de cálcio acima de 395 pg/ml ou mais que 50% do limite normal. Acontece geralmente 120 a 180 minutos após a administração. Teste menos específico e sensitivo do que o de estimulação com secretina. Pode ser utilizado quando a suspeita de gastrinoma é muito alta e o teste as secretina é negativo.
Endoscopia: Aproximadamente 90% dos pacientes apresentam úlceras pépticas (no estômago e no duodeno), sendo a maioria com uma úlcera solitária, menor que 1 cm. Em 75% a úlcera é na primeira porção do duodeno, 14% no duodeno distal e 11% no jejuno. 25% dos pacientes podem se apresentar com hemorragia digestiva alta. Pregas gástricas proeminentes são vistas em mais de 90% dos pacientes. Estenoses de esôfago, duodeno ou estômago em menos de 10%.
Tomografia e Ressonância: Pode mostrar lesões bem pequenas. Quando possível, é realizada com contraste. Auxiliam a determinar o tamanho, número e a localização do tumor, e em consequência, a melhor forma de tratamento. Também ajuda a avaliar o restante o seu fígado. O seu médico irá determinar qual exame a ser solicitado.
Ultrassonografia Endoscópica: Consiste em uma endoscopia associada a uma ecografia que é feita por dentro do seu estômago. Pode auxiliar a determinar se pequenos tumores no seu pâncreas, que não são visualizados em outros exames. Permite realizar biópsia se necessário.
PET scan: É um exame de corpo inteiro que demonstra locais com tumores ativos por todo o corpo. Geralmente não é utilizado
Octreoscan: É um tipo de exame específico para tumores neuroendócrinos. É um exame de corpo inteiro que demonstra locais com tumores neuroendócrinos ativos por todo o corpo. Um marcador ( Indium-penetreotide-111) grudado a uma molécula de somatostatina é administrado via endovenosa. Caso a molécula de somatostatina se junte ao tumor, o marcador demonstra o local do tumor. Detecta lesões de gastrinoma em aproximadamente 60%. Pode demonstrar metástases não visíveis através de outros métodos, e o fato de o tumor ser ou não receptor de somatostatina, pode ajudar a determinar o melhor tratamento.
Biópsia do Tumor: Não é indicada de rotina quando não há dúvida do diagnóstico. Quando indicada, é realizada de forma percutânea, ou seja, uma agulha é introduzida pela pele até chegar ao tumor, ou por ecoendoscopia. Raramente e necessário fazer a biópsia através de cirurgia, seja convencional ou laparoscópica.
Outros exames: A tomografia de tórax pode ser solicitada para excluir metástases pulmonares. Arteriografia com obtenção de amostras de sangue da veia porta após estimulação com cálcio, e até mesmo laparoscopia/Laparotomia com ecografia intra-operatória podem ser utilizados.
A maioria das complicações do gastrinoma é decorrente da grande quantidade secreção de gastrina. Dentre as complicações, destacam-se a perfurações gastrointestinais, estenoses, hemorragia digestiva. Metástases podem estar presentes, sendo o local mais comum o fígado (~90%), seguido de metástases ósseas (~ 8%). O local mais comum de metástase óssea é a coluna vertebral.
Pacientes com gastrinoma são frequentemente tratados com cirurgia. O tratamento do gastrinoma deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar, pois envolve médicos de várias especialidades, como oncologistas, cirurgiões, radiologistas, patologistas e gastroenterologistas. A melhor forma de tratamento é individualizada para cada paciente. Fatores como idade, doenças associadas, número, tamanho e local das metástases, agressividade do tumor, e o desejo de cada paciente sempre são considerados. Pacientes com Neoplasia Endócrina Múltipla (MEN1) são tratado com medicamentos.
Cirurgia para remover o tumor: Indicado quando não há evidência de doença metastática irressecável. Mesmos que não saiba o local de origem do tumor primário (~ 20%), pode ser indicado a laparotomia exploradora. Durante a cirurgia, pode-se utilizar ecografia transoperatória, a transiluminação duodenal por endoscopia, e abertura do duodeno para tentar localizar pequenos gastrinomas. Quando o tumor é localizado, consiste em retirar o tumor através de cirurgia aberta (convencional) ou de cirurgia laparoscópica (vídeo), como remoção dos linfonodos ao redor do tumor. A cirurgia geralmente não é indicada em pacientes com MEN 1. Alguns serviçoes preconizam duodenopancreatectomia quando o tumor não é localizável. Após ressecção curativa, pode demorar alguns anos para os níveis de gastrina voltarem ao normal.
Tratamento Clínico: O objetivo é controlar a secreção ácida produzida no estômago, para evitar complicações como úlceras, perfurações, sangramentos. Como primeira linha é utilizado anti-ácidos, como os bloqueador de bomba de prótons (1ª linha). Ex. Omeprazol 60 mg/1xdia; esomeprazol 120 mg/1xdia; lanzoprazol 45 mg/1xdia; rabeprazol 60 mg/1xdia, pantoprazol 120 mg/1xdia. Pode ser necessário doses maiores ou administração duas vezes ao dia. Após controle dos sinais e sintomas, a dose pode ser reduzida. Pacientes que não conseguem melhora, pode ser utlizado a somatostatina (2ª linha), para diminuir a secreção de gastrina.
Somatostatina: A maioria das células dos tumores neuroendócrinos (> 90%) apresentam em sua superfície um número muito maior dos chamados receptores de somatostatina do que as células saudáveis do corpo humano. As somatostatinas (ex. octreotide, lanreotide) são medicamentos eficazes que, conectando-se aos receptores de somatostatina existentes em células tumorais, inibem o crescimento do tumor, sem causar efeitos colaterais. Também inibe a secreção de hormônios que são secretados por este tumor, melhorando assim os sintomas do paciente. A presença de receptores de somatostatina no tumor pode ser documentada através do octreoscan. A efetividade do uso de somatostatina para gastrinoma não é uniforme, mas pode diminuir o nível de gastrina e diminuir o crescimento do tumor.
Tratamento de metástases hepáticas:
Quimioterapia: Os resultados com quimioterapia convencional não é uniforme na literatura. O mais comum é a associação de drogas, como a streptozocina e doxorubicina. Também não é um tratamento curativo, mas pode diminuir a secreção de gastrina (ate 70%) e diminuir o tumor (10 a 40%). Como efeito colateral pode apresentar insuficiência renal, diminuição da imunidade, anemia, náuseas. Outro medicamento que tem sido utilizado é a temozolomida.
Terapia com radionuclídeo para receptor de peptídeo (TRRP): Consiste na utilização de um derivado de somatostatina (ex. o octreotide) marcado radioativamente. Assim, ao ser injetado no sangue do paciente, a somatostatina circula pelo sangue e se liga as células tumorais presentes em qualquer parte do corpo do paciente, e submete estas células à radiação interna direta. Assim este medicamento mata as células tumorais. A TRRP pode ser utilizada em pacientes que possuem metástases de tumor neuroendócrino que adequa-se, portanto, à radioterapia interna de metástases positivas para possuem receptores de somatostatina.
Radioterapia convencional: Não é utilizada de rotina no tratamento de metástases de tumor neuroendócrino no fígado.
Gastrinomas sem a presença de metástases pode apresentar chance de cura com tratamento cirúrgico. A ressecção de mais de 10 linfonodos tem sido associada a melhor prognóstico. Aproximadamente 25% apresentam metástases no diagnóstico. O sítio primário no pâncreas, tumores maiores que 3 cm, presença de linfonodos comprometidos, gastrina > 1000 são associados com maior chance de metástases hepáticas. Pacientes sem metástases tem sobrevida média em 10 anos de 83% e em 5 anos de aproximadamente 90%. Em pacientes com metástases hepáticas, a sobrevida em 10 anos é de 30%. Pacientes com MEN 1 possuem somente 6% de metástases no diagnóstico e sobrevida de até 100% em 20 anos.
Nível de gastrina e tomografia/ressonância em 3 a 6 meses. A seguir, marcadores tumorais a cada 6 a 12 meses até o terceiro ano. Outros exames de imagem somente se há suspeita clínica de recidiva.
A remoção do tumor primário em estágios iniciais pode evitar o aparecimento de metástases. Uma vez que o paciente tenha tumor neuroendócrino, o tamanho do tumor primário e sua localização influenciam as chances de ter metástases hepáticas. Não existem fatores de riscos conhecidos para adquirir o gastrinoma. Estudos sugerem que possuir um familiar de primeiro grau com história de tumor neuroendócrino aumenta o risco relativo de ter tumor em 3,6 vezes.